CONTRATO PREST.SERVIÇOS, EMPREITADA E CONTRATO DE TRABALHO
Pautados no princípio da hipossuficiência do obreiro, em grande maioria, as ações distribuídas perante uma das Varas Federais…
I – Introdução
A difícil, por que não se dizer quase impossível, obrigação do advogado contratualista de demonstrar ao juiz da causa que em determinadas situações a aplicação dos pressupostos afeitos aos contratos regidos pela lei civil se sobrepõem à legislação trabalhista, atualmente, é tarefa hercúlea.
Pautados no princípio da hipossuficiência do obreiro, em sua grande maioria, as ações distribuídas perante uma das Varas Federais do Trabalho têm logo acolhida judicial tal como se insculpissem relações provenientes de pactos laborais e refletidas mediante os contornos determinados pela Consolidação das Leis do Trabalho.
Ora, a situação é tão preocupante que até mesmo os profissionais contratados para elaboração destes instrumentos jurídicos, preliminarmente, já asseveram a seus contratantes que a sustentação do contrato de prestação de serviços ou mesmo do contrato de empreitada, hoje, em determinadas atividades é risco iminente.
II – Do contrato de prestação de serviços
A palavra-chave para não cometer erros na elaboração de contratos de prestadores de serviços é a formalização, no sentido de que na informalidade há um aumento de suspeita do juízo acerca da regularização das relações do serviço prestado.
Há premissas básicas para que não surjam problemas na relação com o prestador: Formalização; tudo que é exceção na Justiça do Trabalho tem que ser documentado na seara civil; Materialidade: fora do papel não adianta ter o requisito formal se não tiver os requisitos reais desta relação.
De qualquer forma, apesar de delineado no art. 593 e seguintes do Código Civil, vigente o contrato de prestação de serviços, para que seja acolhido, necessita, obrigatoriamente, ter o reconhecimento ao menos em partes ponderadas das seguintes proposições:
1. Competência Residual: Justiça Comum Estadual, sempre que a situação em que se envolvam as partes não estejam sujeitas às leis trabalhistas ou à lei especial;
2. A forma de pagamento da contratação, conforme expressamente delineado no art. 594 do Código Civil dar-se-á mediante Retribuição, não se tratando aqui de trabalhador submetido a salário, conforme pontuado pela CLT.
Não há, desde logo, características essenciais que possam comparar o referido contrato sob análise com o contrato laboral, vez que inocorrentes os atributos essenciais dispostos no art. 3º da CLT. De certa forma, tais requisitos também aparecem nos contratos de prestação, todavia, sob outro ângulo e profundidade.
3. Assim, ao analisarmos a característica, por exemplo, da subordinação, fica claro que o Contratante da Prestação também terá direito a se impor ao Contratado em determinadas situações de ordem geral, especificamente nestas oportunidades, estaríamos tratando de meras orientações técnicas de pequeno grau de subordinação e que diretamente se impingem aos serviços que necessitam ser efetuados daquela maneira, jamais podendo ser confundidos com o quesito constante da legislação trabalhista pura, de submissão plena às normas da empresa reclamada;
4. Quanto à habitualidade, há de se contestar a regularidade, assiduidade e comprometimento diário com que o trabalhador regido pela CLT deve se submeter, ficando o prestador de serviços possibilitado de, a qualquer tempo, ausentar-se do local da prestação, sem horário de entrada ou saída para prestar inclusive serviços a outros Contratantes. Novamente, cabe ponderar que há pequena dose de comprometimento e responsabilidade com dias e horários pré-determinados, mas que, todavia, como já dito alhures, não é capaz de ensejar enquadratura perante à legislação do trabalho;
5. Quanto ao quesito da dependência econômica o prestador fica liberado para contratar com quaisquer outras empresas que lhe convier, desde que haja compatibilidade de horários para tanto.
Algumas ponderações específicas ao contrato de prestação de serviços podem ser acrescentadas quando de sua elaboração. Dentre elas podemos citar o art. 598 do CC, que fixa o prazo limite de 04 (quatro) anos de duração para convenção do referido instrumento, podendo ser renovado por igual período, já que se aplicam as regras gerais dos contratos regidos pela lei substantiva civil. E mais, como as regras gerais dos contratos, delineados nos artigos 421 e seguintes da lei civil, se aplicam ao caso em comento é de boa técnica também se considerar que o mesmo também poderá ser rescindido através de notificação prévia de 30 (trinta) dias.
Por derradeiro, cabe frisar que a nomenclatura utilizada pelo Código Civil de 2002 foi infeliz ao utilizar determinados termos já contemplados pelo diploma trabalhista, de modo que podem dar azo a determinadas situações em que o Juiz da causa entenda tratar-se o referido contrato como daqueles aplicados nas relações de trabalho.
Dentre os termos sob os quais caberia uma notável correção e elencados na lei substantiva civil encontramos o termo “aviso” delineado no art. 599, confundindo-se com o termo “aviso prévio” da CLT; o termo “justa causa” do art. 603, identicamente utilizado na legislação obreira, sem se falar da impropriedade jurídica constante do art. 599, “resolver o contrato”, quando o mesmo se subsume às formas de extinção de qualquer contrato; frise-se, podendo ser distratado, inclusive; ou resilido o referido documento elaborado entre proponente e oblato (01).
Por tudo até aqui exposto, o Direito Civil, embora tenha vinte séculos de construções, não é infenso à imprecisão. Podemos bem ver a variabilidade de sentidos dados aos termos pelo legislador quando trata dos contratos de prestação de serviços e a seguir nos contratos de empreitada.
Assim, especificamente quanto aos institutos tratados nos artigos retrocitados, nenhum critério de cunho jurídico/científico mais especializado foi utilizado, pontuando e impondo-se ao juiz, diante do caso concreto, excluir uma posição em detrimento de outra, questionando: “- há relação de trabalho ou não no caso sub judice?” – cabendo ao advogado contratualista superar as deficiências da lei e adversidades da vida prática.
III – Do contrato de empreitada
Em que pesem as considerações já apresentadas no tópico anterior, o contrato de empreitada delineado no Código Civil a partir do art. 610 padece das mesmas dificuldades práticas e jurídicas quando da apuração judicial de efetiva atividade prestada pelo contratado (02).
Na prática, o presente instrumento encontra enquadratura em quase cem por cento dos casos afeitos às obras de construção civil, sendo de preferência, inclusive dos profissionais do Direito, o abarcamento dentro destas situações. Na empreitada não importa o rigor do tempo de duração da obra, o objeto não é a simples prestação de serviços, mas a obra em si. Assim, desse tipo de contrato a remuneração não está vinculada ao tempo, mas à sua conclusão.
A referida contratação poderá ocorrer em relação ao trabalho do contratado, ou ainda em relação à obrigação de fornecimento dos materiais necessários à consecução dos atos contratados. Diz-se a primeira contratação de “lavor” ou trabalho e a segunda de materiais, podendo inclusive ser cumuladas, quando passará a ser designada como mista.
Assevera claramente o doutrinador José Carlos Fortes em sua pontual análise acerca dos contratos de empreitada (03) que:
“Em decorrência da entrega dos materiais podem advir alguns ônus decorrentes dos riscos que normalmente não são considerados na contratação. Assim estabelece o código que, quando o empreiteiro fornece os materiais, correm por sua conta os riscos até o momento da entrega da obra, a contento de quem a encomendou, se este não estiver em mora de receber. Mas se estiver, por sua conta correrão os riscos. Destaque-se que se o empreiteiro só forneceu mão-de-obra, todos os riscos em que não tiver culpa correrão por conta do dono. Sendo, porém a empreitada unicamente de lavor (art. 610), se a coisa perecer antes de entregue, sem mora do dono nem culpa do empreiteiro, este perderá a retribuição, se não provar que a perda resultou de defeito dos materiais e que em tempo reclamara contra a sua quantidade ou qualidade”.
Por determinação legal, concluída a obra de acordo com o ajuste, ou o costume do lugar, o dono é obrigado a recebê-la. Esta obrigação, porém, não é absoluta, pois poderá o proprietário rejeitá-la, ou exigir abatimento no preço, se o empreiteiro se afastou das instruções recebidas e dos planos dados, ou das regras técnicas em trabalhos de tal natureza. Daí se pode inferir que a obrigação de pagar é secundária se comparada com a principal de recebimento do avençado.
Por derradeiro, cabe frisar acerca da possibilidade de contratação via sub empreitada, desde que para atuação em outras áreas não conhecidas pelo contratado, tendo-se em consideração sua total improcedência quando a contratação tem caráter essencialmente personalíssimo, oportunidade em que a sub-empreita, de plano, encontra-se descartada.
A extinção do contrato de empreitada ocorre pelo seu cumprimento e pode resolver-se se um dos contratantes não cumpre qualquer das cláusulas assumidas. Por fim, não se extingue o contrato de empreitada pela morte de qualquer das partes, salvo se ajustado em consideração às qualidades pessoais do empreiteiro.
Derradeiramente cabe asseverar que os mesmos problemas enfrentados pelo contratualista ao elaborar a minuta de prestação de serviços serão encontrados no contrato de empreitada, em especial, pela sensível tendência de todos eles serem apurados e julgados perante a ponderação do princípio da hipossuficiência pela Justiça Federal do Trabalho. Nesse sentido, a titulo de elucidação e encerramento segue jurisprudência pátria acerca do assunto (04).
Notas
(01) Oblato é considerado, pelo Direito, como a pessoa a quem é direcionada a proposta de um contrato. Que será aceita ou não, dependendo da sua manifestação de vontade. A expressão é sinônima de aceitante ou aderente. A manifestação de aceitação do oblato é necessária ao aperfeiçoamento do contrato, mas consiste somente na aceitação ou não das cláusulas contratuais já propostas e de autoria exclusiva do policitante, uma vez que não são suscetíveis de alteração. No artigo 427 do Código Civil de 2002 vemos a figura do proponente, e, a quem é direcionada a proposta, chamamos de oblato.
(02) Empreitada é o contrato mediante o qual uma das partes (o empreiteiro) se obriga a realizar uma obra específica, pessoalmente ou por intermédio de terceiros, cobrando uma remuneração a ser paga pela outra parte (proprietário da obra), sem vínculo de subordinação. A direção do trabalho é do próprio empreiteiro, assumindo este os riscos da obra.
(03) Contrato de empreitada 07/04/05 (http://www.fortesadvogados.com.br/artigos.view.php?id=566)
(04) PROCESSO Nº: 00085.2003.061.14.40-5; CLASSE: REMESSA OFICIAL E RECURSO ORDINÁRIO; ORIGEM: VARA DO TRABALHO DE COSTA MARQUES/RO; RECORRENTE: INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVÁVEIS – IBAMA; ADVOGADO(S): MARCO ANTONIO R. MAIA; RECORRIDO: SEVERINO TEZORI ; ADVOGADO(S): JOSÉ NEVES BANDEIRA; RELATOR: JUIZ CONVOCADO FRANCISCO DE PAULA LEAL FILHO;REVISORA: JUÍZA MARIA DO SOCORRO COSTA MIRANDA. PEQUENA EMPREITADA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. O litígio envolvendo contratos de empreitada, em que o pequeno empreiteiro também figura como operário ou artífice, na forma definida pelo art. 652, alínea “a”, inciso III, da CLT, insere-se na competência da Justiça do Trabalho, fixada pelo art. 114 da Constituição Federal, para conciliar e julgar outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho