Sob uma perspectiva de responsabilização, pode-se apontar que as obrigações sejam de meio e de resultado. No primeiro caso, o contratante se obriga a cumprir as melhores regras técnicas, sem um compromisso com o resultado final (desde que os meios empregados sejam os adequados não haverá responsabilização se o resultado não for atingido). Já na obrigação de resultado, como o próprio nome indica, não basta cumprir as regras técnicas, o compromisso está com a consecução do que se prometeu.

E aí já se abre espaço para uma pequena observação: Quando uma relação for disciplinada pelo Código Civil, haverá necessidade de um detalhamento adequado a respeito do que se esperar do contrato (se de meio ou se de resultado), enquanto que numa relação de consumo, diante da hipossuficiência técnica do mesmo, se a obrigação não for de resultado, isso deve ser devidamente explicado, em linguagem muito acessível, sob pena do fornecedor ser obrigado a apresentar o resultado esperado.

 

Numa rápida definição, hoje o direito acolhe três teorias sobre consumo (finalismo – consumidor é o destinatário final de produtos ou serviços; maximalismo – o conceito de consumidor pode ser alongado para além do destinatário, como se dá, por exemplo, no caso da vítima de um acidente de consumo e o finalismo aprofundado – mesmo que não se tenha um destinatário final, se houver patente hipossuficiência a relação poderá ser disciplinada pelas regras do Código do Consumidor).

Isso é ponderado para demonstrar para o não operador do direito (por exemplo, o médico, o enfermeiro, o administrador hospitalr, o engenheiro e por aí vai) que, como digo em aulas, o mundo é um lugar perigoso para se viver – o risco de ser demandado é altíssimo, mesmo não se tendo sequer consciência de que se tenha violado a lei (afinal, nos termos do artigo 3º LINDB – Lei de Introdução às Normas de Direito Brasileiro – ignorantia legis nemo excusat, parêmia latina que, traduzida, implica na ideia de que ninguém poderá alegar a ignorância da lei).

Em relação de consumo, as entrelinhas geralmente são interpretadas em favor do consumidor contratante, sobretudo se o contrato for um modelo pronto (chamado contrato de adesão pelo profissional do direito), daí a importância de expor, com riqueza de detalhes, o que está sendo proposto para o consumidor (na lacuna, na obscuridade, na contradição, se interpretará em favor do consumidor – artigo 47 CDC).

 

No caso dos autos, até por conta de ser coordenador de um curso de pós-graduação de direito médico (para profissionais do direito e para profissionais da saúde) orientarei a explanação seguinte para os profissionais destas áreas, embora o raciocínio possa ser perfeitamente aplicável para outros ramos do mercado, como, por exemplo, escolas ou engenheiros.

Via de regra, num contrato que tenha por objeto a prestação de serviços relacionados com a saúde, a prestação de serviços médicos, se entende que o mesmo seja composto por obrigação de meio, ou seja, o profissional irá empregar todos os meios técnicos adequados e necessários para aquele dado tratamento – obrigação de meio.

Assim, se o paciente vier a falecer e não tiver os resultados que entendia adequados, não poderá responsabilizar o profissional, a menos que comprove que o mesmo não se utilizou de técnicas adequadas ou as melhores possíveis – o risco de ser demandado e de perder a demanda é sensivelmente menor.

E isso poderá vir a ser invertido, por exemplo, se na divulgação da atividade (publicidade) tenha sido feita oferta ao público ou ao paciente, de resultados – nesse caso o consumidor poderá invocar que a oferta (policitação) deverá ser estritamente cumprida (geralmente as atividades dos profissionais da saúde são entendidas como relações de consumo).

Há no entanto, dentro do nicho profissional da saúde, exceções., como se dá no caso dos profissionais que lidam com valores estéticos (cirurgiões plásticos, dentistas etc). Nesse nicho do mercado o que se tem é que sempre se busca o embelezamento, a melhoria estética (não se admite, por incrível que pareça o termo é este mesmo, o chamado “afeiamento” – circunstância apontada por Maria Helena Diniz).

Assim, nos atendimentos com o objeto estético, a regra será o reconhecimento da obrigação como sendo de resultado, não bastando empregar os meios técnicos necessários, deve ter havido algum ganho em melhoria estética. E isso se agrava, por exemplo, naqueles procedimentos em que os profissionais se utilizam de programas de computador que simulam os resultados (transformação da mulher em sósia de modelo famosa) sem que o resultado final se aproxime daquela promessa.

Mesmo assim, nos Tribunais, ainda se encontram exceções à exceção, ou seja, casos em que não se indeniza mesmo quando não há ganho estético, por exemplo, quando todos os meios técnicos foram empregados, mas fatores imprevisíveis impediram o ganho estético, como determinadas condições genéticas.

O profissional de saúde, no entanto, pode evitar muitos transtornos (hoje se entende que em casos em que o resultado estético não é o adequado – podem ocorrer quatro tipos de indenizações distintas, pelo menos: danos estéticos quando ocorre o tal afeiamento, danos morais pelo que a pessoa sofre internamente com dores e sentimentos negativos ou pela forma como os outros a enxergarão, danos materiais decorrentes das perdas monetárias, com o que se perdeu com o tratamento que deverá ser devolvido ou pelos dias em que a pessoa ficou parada por conta de procedimento mal sucedido, ou ainda o que se irá gastar com outro profissional para reparar o resultado sem sucesso, e, por fim, a perda da chance, por exemplo, a pessoa que se programa para ser contratada como modelo, e perde a oportunidade por conta do mau resultado.

Sim, todas essas indenizações podem ser cumuladas (vejam-se, por exemplo, as Súmulas nº 37 e 387 ambas do Superior Tribunal de Justiça), de modo que a adoção de cautelas como contratos bem elaborados, com termos de fácil compreensão (a ideia é que se faça, até mesmo um glossário didático), bem como a documentação adequada do que foi combinado (por exemplo, gravação do atendimento) são situações que podem implicar num risco menor de ser processado ou de experimentar uma condenação de grande valor.

Vale, portanto, a dica, ou se consulta um profissional com qualificação adequada (advogado com especialização em regras de saúde) ou se recomenda o aprofundamento profissional realizando um curso de normatização dos mercados de saúde (as faculdades deste setor geralmente não preparam o profissional de saúde para os desafios de um mundo permeado pela litigiosidade). Venha conhecer nossos cursos.

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